A Maria e o novo amigo alienígena Alberto estão a arranjar a nave ultrassónica que há uma semana aterrou de emergência na ventosa Aldeia do Vento, no planeta Terra.
— Terminei agora!
— A Maria tem jeito para a mecânica cósmica.
— Não sobraram peças …
— Tenho de fazer algo e rapidinho. A 111-RTX está capaz de descolar.
— Falta apenas compor o exterior da nave… Onde estarão as portas?
— Boa! Sem portas não posso partir! Sem portas não há adeus!
— Só vejo pilhas de tralha ao meu redor.
— Ficarei nesta aldeia 12 meses galácticos.
— Como se eu tivesse capacidades divinatórias…
— Por mil Girabolexes, Maria, estás a ficar roxa!
— Roxo ficas tu quando eu te apanhar!
— Que linda brincadeira, Maria: um alienígena a fugir de uma criança terráquea!
— Eu dou-te a brincadeira! Fica sabendo que o teu verde está a empalidecer e as tuas antenas a cair.
— Está a esgotar-se o meu tempo na Terra…mas eu não quero ir embora!
— Mas tu és um adulto, não fazes birras. E podes visitar a Aldeia do Vento sempre que quiseres. Com a força das tuas antenas, nunca voarás.
— Poderia viver aqui, numa das casas desabitadas…não sou de luxos.
— Alberto, nem luxos, nem lixos. A tua família espera-te!
— Bzz. Zyrx. Ai!
— Então, Alberto?
— Este é o som da inevitabilidade… É o som da minha morte! — responde Alberto, recordando Leo no filme Matrix, rodado em Girabolas, o seu planeta.
— Calma, Alberto! És muito pessimista. Vamos acabar o arranjo da tua nave. Onde estão as portas que escondeste? — quis saber a Maria, angustiada por ver a estranha fraqueza do amigo. Alberto indicou-lhe o lugar, envergonhado como uma criança apanhada em flagrante delito.
— Ajuda aqui. Encontrei-as, mas são demasiado pesadas para mim.
Alberto fez um derradeiro esforço, dirigindo um raio de luz das portas para a nave.
— Boa, querido amigo! Agora temos que te pôr lá dentro e programar a viagem para que não te percas no espaço cósmico. Vamos! Só mais uma magia!
Alberto sabia que não havia solução, tinha ido longe demais e o espaço não se encontrava a seu favor. Estava no meio do caminho, num intermédio frágil entre a vida e um longo sono.
— Mas, o que é aquilo? — perguntou a Maria ao ver uma bola de luz roxa e branca aproximar-se da Terra — Parece…outra nave espacial?! Alberto, acho que vem ajudar-te… — e uma manga de luz apanhou o alienígena, teletransportando-o para o seu interior.
— Boa viagem, querido amigo, boa viagem! — disse a Maria, acenando sem saber muito bem se havia de se sentir feliz ou triste e era uma lágrima frágil a que o vento roubava do seu rosto de criança.
Andreia Galhardo
- janeiro 2024