O correio apenas chegava ao quartel uma vez por semana. Para proteger o saco de lona grossa e verde, era exigido que fosse escoltado por viatura militar com seis mancebos armados, afastando assim o perigo de assalto inimigo, em busca de segredos e estratégias bélicas.
Do cimo das escadas desgastadas pelas subidas e descidas de enlameadas botas, o cabo amanuense grita para a multidão, ansiosa por ouvir o seu nome:
—Soldado Santos!
O nomeado fura a turba impaciente. Agarra a pequena carta azul-bebé, dobrada em envelope. Acha estranho não ver corações vermelhos desenhados nas abas laterais e frontais. Um pressentimento ruim aperta-lhe o peito, enquanto se senta debaixo do alpendre escuro e triste da caserna. Lê lentamente uma frase, seca e apunhalante:
—Manel, não aguento esperar mais dezoito meses. Conheci outro homem.
O Santos corre dali à cantina, para beber a primeira das milhares de cervejas que se seguiriam.
José Mendes
- Junho 2023