O tronco da velha árvore já não vive. Os ramos perderam as folhas. Os pássaros tímidos não podem mais esconder as suas coreografias amorosas. Os ovos azuis pintalgados de negro não têm onde eclodir para novas vidas, sôfregas e frágeis, de bicos escancarados por alimento. Uma rajada de vento forte pô-la à prova. Desistiu de fazer-lhe frente e jaz agora junto ao espelho quieto e cinzento do lago.
O melro preto voa e salta descontraído. Olha espantado para os vultos humanos e estranhos que lhe invadiram de repente o relvado aparado de fresco. Parecem perdidos. Preenchem papéis brancos com canetas que riscam de dourado. Sente fome. Com as suas garras, arranca uma casca ressequida do tronco abandonado. Surge uma colónia de larvas e formigas pretas grandes e gordas que correm em rumos escangalhados, a oportunidade única da refeição merecida. Aproveita-a com sofreguidão. As forças regressam e já pode cumprir o desígnio de cantar até que o sol se esconda por trás dos plátanos ao fundo da herdade. A missão que lhe fora destinada pode, finalmente, ser cumprida.